FLORES NEGRAS

 

Ouve: sob as ruínas das minhas paixões,

e no fundo desta alma que já não alegras,

entre a poeira de sonhos e de ilusões

jazem intumescidas as minhas flores negras.

 

Elas são a lembrança daquelas horas

em que presa nos meus braços adormecias,

enquanto eu suspirava pelas auroras

dos teus olhos, auroras que não eram minhas.

 

Elas são as minhas dores, feitas botão;

as dores intensas que nas minhas entranhas

sepultam as suas raízes, qual fetos

nas húmidas fendas das montanhas.

 

Elas são os teus desdéns e censuras

ocultos nesta alma que já não alegras;

são, por isso, tão negras como as noites

dos gélidos pólos, minhas flores negras.

 

Guarda, pois, este triste, débil ramo,

que te ofereço daquelas flores sombrias:

guarda-o, nada temas, é um despojo

do jardim das minhas fundas melancolias.

 

 

 

TUDO NOS CHEGA TARDE

 

Tudo nos chega tarde… até a morte!

Nunca se satisfaz nem alcança

a doce possessão de uma esperança

quando o desejo nos assalta mais forte.

 

Tudo pode chegar: mas também se adverte

que tudo chega tarde: a quietação

depois da tragédia: a ovação

quando já a inspiração está inerte.

 

A justiça mostra-nos a sua balança

quando os seus séculos na História verte

o Tempo mudo que no orbe avança;

 

E a glória, essa ninfa da sorte,

só sobre as sepulturas dança.

Tudo nos chega tarde… até a morte!

 

 

“UM PAÍS QUE SONHA (Cem anos de poesia colombiana)”.  Selecção e prólogo de Lauren Mendinueta. Tradução de Nuno Júdice (Lisboa, Assírio & Alvim, 2012)

JULIO FLOREZ (1867-1923)

capaNasceu em Chiquinquirá (Boyacá). Aos 7 anos de idade escreveu os seus primeiros versos conhecidos. Em 1881 iniciou estudos de literatura em Bogotá, a capital do país, mas teve de interrompê-los por causa da guerra civil de 1885. Em 1905 foi forçado ao exílio pelo ditador Rafael Reyes. Viveu em vários países latino-americanos, entre eles Venezuela e México. Em 1909 regressou à Colômbia e retirou-se para Usiacurí, um pequeno povoado da costa norte. Ali se apaixonou por uma jovem de 14 anos com quem casou e teve cincos filhos. Flores é considerado um dos maiores poetas populares da América Latina.

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Un comentario en “Dois poemas de Julio Flórez em português”
  1. Juan Cuadros (1 comments) dijo:

    Belo poema. Obrigado pela contribuição

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